Informativo
"Reforma implode consumo e transforma mercado de trabalho em selva"
Para
o economista Guilherme Mello, a reforma trabalhista sancionada por Michel Temer
não deverá gerar crescimento, emprego ou renda. Ao contrário. Na sua avaliação,
as mudanças reduzirão rendimentos do trabalhador, implodindo o mercado interno
consumidor, com impactos na lucratividade do empresariado. Segundo ele, a nova
legislação parte, portanto, de uma visão "míope" da economia e
transforma o mercado de trabalho em uma “selva”, na qual em geral vencem os
mais fortes – nesse caso, os patrões.
“Essa
reforma visa transformar o mercado de trabalho em algo completamente aberto, em
uma selva, onde é cada um por si. E, nesse cada um por si, geralmente o mais
forte ganha. E o mais forte quase sempre é o patrão”, disse, em entrevista
ao Vermelho.
Professor do Instituto de Economia da Unicamp, Guilherme Mello rechaçou o
discurso do governo de que a reforma ajudará a recuperar empregos e a
rentabilidade das empresas, com impactos positivos na economia.
“A
reforma busca reduzir custos com o fator trabalho, na esperança de que os
patrões não só empregarão mais pessoas, como a rentabilidade dessas empresas
irá melhorar e irá haver crescimento, porque lucrando mais elas iriam investir
mais. Mas essa é uma visão equivocada", afirmou.
Segundo
ele, com o passar do tempo, os próprios empresários começarão a perceber que,
ao reduzir o custo do fator trabalho, estão minando o seu próprio mercado
consumidor. Isso porque essa redução de custo para o empregador representará
perda de renda e instabilidade para o empregado. Com menos dinheiro e com medo
de perder o emprego, o trabalhador terá menor apetite para se endividar e
consumir. O resultado dessa equação é que, com exceção dos exportadores, os
empresários ficarão sem ter para quem vender seus serviços e produtos.
“O
cara olha a empresa dele e acha o trabalho um custo a ser reduzido. Ele acha
que, reduzindo esse custo, vai melhorar a situação financeira da empresa. Mas
ele desconsidera que a economia não é uma empresa, mas um conjunto complexo de
agentes, empresas, trabalhadores, interdependentes. Se todas as empresas passam
a pagar menores salários, os trabalhadores têm menos renda, consomem menos,
portanto, há menos necessidade de produção nas empresas, que vendem menos e têm
menos lucro”, detalhou.
De
acordo com o economista, um argumento parecido foi utilizado pela gestão de
Dilma Rousseff, não para retirar direitos dos trabalhadores, mas para reduzir o
pagamento de impostos para os empresários. Ao beneficiar o setor produtivo com
desonerações tributárias, a gestão petista esperava que as verbas economizadas
fossem utilizadas para contratar novos trabalhadores, fazer mais investimentos
e promover crescimento econômico, o que não se verificou.
“Não
houve crescimento, não houve investimento e é verdade que o desemprego se manteve
baixo, mas isso em decorrência de acordos que foram feitos à época. Agora não
há acordo nenhum”, apontou.
Sua
expectativa é de que o resultado da reforma seja mesmo a retirada de direitos
do trabalhador. “E não são benefícios fora do comum. Fala-se como se o
trabalhador brasileiro vivesse nababescamente, cheio de direitos, mas olha o
nível salarial do Brasil! Alguns falam: ‘ah, mas a China é competitiva porque
tem os salários baixos’. Mas o nível médio do salário da indústria na China já
é maior que o do Brasil”, compara.
Ele
também rebateu a ideia de que na China a mão de obra barata teria motivado o
crescimento do país. “Qualquer pessoa que tenha estudado minimamente a China
sabe que a ascensão lá foi muito mais via investimento em infraestrutura,
estratégia de inserção, pesquisa e tecnologia reversa, via o câmbio
desvalorizado, que pela questão meramente do preço do fator trabalho”,
completou.
NA CONTRAMÃO DO MUNDO
Mello
opinou ainda que o Brasil vai na contramão do mundo, uma vez que análises
internacionais têm mostrado um impacto negativo da flexibilização da legislação
trabalhista na economia.
“Para
você ver como sempre o Brasil está atrasado, recentemente, o Fundo Monetário
Internacional (FMI) indicou, em um relatório sobre as perspectivas do
crescimento global, que apesar de no curto prazo ter um balanço positivo no
cenário global, no médio e longo prazo eles não estão tão otimistas. E uma das
razões que o FMI elenca para isso é a precarização do mercado de trabalho e o
fato de que os trabalhadores estão com salários baixos, rendas comprimidas
pelas medidas de liberalização no mercado de trabalho, pelas reformas
trabalhistas mundo afora”, descreveu.
E,
no momento em que até o FMI constata que as perspectivas de médio e longo prazo
dos países estão sendo negativamente afetadas por causa do mercado de trabalho
extremamente desregulado, que gera pouca renda e limita a taxa de crescimento
do consumo e da demanda, o Brasil aprova “uma reforma draconiana, bastante
liberal, que é uma mudança completa nos usos e costumes da relação
empregador-trabalhador”, criticou.
MAIS EMPREGO OU ILUSÃO
ESTATÍSTICA?
Para
Guilherme Mello, ao contrário do que defende o governo, não é possível dizer
que as mudanças na legislação trabalhista irão gerar empregos no país. Segundo
ele, a decisão de contratar ou não novos trabalhadores está muito mais
relacionada à situação geral da economia que ao custo do fator trabalho.
“O
nível de emprego não é determinado simplesmente pelo custo do trabalho. O
empregador não fala: ‘ah, o trabalho está muito caro, não vou mais contratar’.
Ele faz um cálculo: qual é a taxa de lucro que vai ter se contratar mais um
trabalhador e aumentar a produção? Isso depende das expectativas dele sobre a
demanda, sobre o preço do produto dele, sobre a economia. Ele observa se vai
ter crescimento, se vai ter demanda interna ou externa”, ressaltou.
De
acordo com ele, para se ter uma ideia, no Brasil, o peso do fator trabalho é
muito pequeno na estrutura de custo das empresas, é menor que 10%. “Tem que
olhar mais para as características da economia. E, aqui, a economia depende
muito do consumo. Se você tira dinheiro das famílias, você trava a economia e,
se trava a economia, não gera empregos”, declarou.
Apesar
disso, Mello avaliou que, do ponto de vista das estatísticas, pode aparecer uma
redução de desemprego. Isso porque uma parte dos trabalhadores que vivia na
informalidade, poderá ter seu vínculo formalizado, mas de uma forma
extremamente precária. “Ele pode até ganhar menos, trabalhar em uma situação
pior, mas estará formalizado. Porque agora essas contratações precárias são
permitidas. Então, na estatística, ele vai aparecer empregado, mesmo que
trabalhe três, quatro horas por semana, a critério da necessidade do patrão”,
disse.
“Pode
gerar algum efeito estatístico, mas não vai gerar retomada da economia, do
crescimento, da renda, do emprego. E vai na contramão da experiência
internacional”, completou.
O VERDADEIRO GOLPE
O
professor da Unicamp defendeu que, do ponto de vista político, empresários e
seus representantes no Parlamento viram no governo Temer uma janela de
oportunidades: “um governo disposto a bancar isso, que não liga para a
impopularidade do tema e que apostou todas as fichas da recuperação econômica
em uma agenda ultraliberal, questionada no mundo inteiro e que aqui tinha sido
estancada a partir de 2004, 2005”.
De
acordo com ele, boa parte do empresariado brasileiro está inserido em uma
lógica pouco produtiva e pouco nacional. “Ele está muito inserido no mercado
financeiro, a lógica dele é a de ganhos financeiros, em grande medida. E boa
parte da estrutura produtiva brasileira é de multinacionais. E o que não é
fornece para multinacionais, tem relação com multinacionais ou aspira ser
vendido para multinacional”, afirmou.
Nesse
sentido, os empresários teriam decidido aproveitar a gestão Temer para “aprovar
tudo de mais radical que pudessem, na reforma trabalhista, na previdenciária,
no teto de gastos, na Petrobras”. A estratégia seria, em pouco tempo,
transformar completamente as relações estruturais, jurídicas, institucionais do
Brasil.
“Acho
que essa reforma está fadada ao fracasso e acho que esse foi o verdadeiro golpe
– uma janela de oportunidade que abraçaram com unhas e dentes para desmontar e
revolucionar as instituições brasileiras à revelia da vontade das pessoas”.
ÀS AVESSAS
Mello
disse ainda não ser contrário a revisões na legislação trabalhista. Para ele,
contudo, a mudança deveria ser em outra direção e debatida com a
sociedade.
“Devia
priorizar o fortalecimento dos sindicatos, para que sejam mais representativos,
atuantes e autônomos; devia pensar nas mudanças nas relações de trabalho e em
como garantir mais proteção a essas novas formas de trabalho, ao mesmo tempo
reduzindo a burocracia. Mas essa reforma parece ter sido pensada de forma a
enfraquecer os sindicatos, as representações dos trabalhadores, enfraquecer a
Justiça do Trabalho e, ao invés de ampliar a proteção daqueles que estavam
desprotegidos, a ideia é tirar a proteção dos que estavam protegidos”, condenou.
Na
sua opinião, a reforma trabalhista dá mais poder aos patrões, em detrimento dos
trabalhadores, o elo mais vulnerável na relação de trabalho. “Antes havia a
Justiça do Trabalho que regulava e protegia os trabalhadores. Agora a Justiça
trabalhista perde boa parte de sua força, sobrepujada pelos acordos. Então você
aumenta o poder negociação dos patrões e diminui o dos trabalhadores”,
encerrou.
Veja mais
-
Vale-Tudo: salvação de Temer custará R$ 300 bilhões aos brasileiros
A salvação de Temer, acusado de corrupção, além dos prejuízos políticos para o país, tem um custo econômico altíssimo. Os R$ 11 ...24/07/2017 -
Abimaq: Aumento de impostos revela fracasso da equipe econômica
Para o presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, o aumento d ...21/07/2017 -
Centrais vão a Brasília e propõem alternativa ao fim da contribuição sindical
Representantes do movimento sindical reuniram-se quinta-feira (20) com o presidente Michel Temer e sugeriram uma alternativa ao ...21/07/2017 -
Dieese alerta que a nova lei trabalhista visa afastar o trabalhador do sindicato
Aprovada pelo Senado Federal, no último dia 11 de julho, a reforma trabalhista, dentre outras medidas perversas, decreta o fim d ...20/07/2017 -
Reformas de Temer são legados da escravidão, diz Ciro Gomes
“Essas reformas são um legado escravista", afirma Ciro Gomes (PDT), ex-governador do Ceará (1991-1994), a respeito das reformas ...20/07/2017 -
Inconstitucionalidades da reforma podem criar batalha jurídica, diz advogado e assessor da CTB
O impasse em torno da aplicação da reforma trabalhista promete gerar uma batalha jurídica. A opinião é do advogado trabalhista M ...19/07/2017 -
"Reforma trabalhista de Temer não gerará emprego", afirma presidente do TRT de São Paulo
"É importante que o trabalhador compreenda que esta reforma não é a chave para a solução do emprego no país. Ela tem sido vendid ...18/07/2017 -
Porque a direita teme a eleição de 2018
Em toda a história republicana o Brasil nunca viveu uma crise semelhante à atual, caracterizada pelo maior e mais profundo divór ...17/07/2017 -
Ação popular por anulação do golpe avança com Lula e Chico Buarque
Comitês em diversas capitais se mobilizam para coletar 1,3 milhão de assinaturas para pressionar o STF a anular o impeachment de ...17/07/2017 -
"A luta em defesa dos direitos dos trabalhadores vai continuar", avisa presidente da CTB-RS
Guiomar Vidor, presidente da CTB-RS e da Fecosul (Federação dos Comerciários do RS) , que esteve em Brasília com dirigentes sind ...14/07/2017 -
Temer sanciona reforma que ataca direitos do trabalhador
Em uma cerimônia cujos discursos pareciam tratar de uma realidade paralela, o presidente Michel Temer sancionou, nesta quinta (13 ...14/07/2017 -
Movimentos: Sentença contra Lula consuma golpe contra trabalhadores
Em entrevista ao Portal Vermelho nesta quarta-feira (12), dirigentes de movimentos sociais e sindicais criticaram a condenaç ...13/07/2017 -
Sentença contra Lula fere todos os princípios do direito
O juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato na primeira instância, condenou o ex-presidente Luiz Ináci ...13/07/2017 -
Sicsú: Reforma trabalhista faz país regredir aos tempos de colônia
A contrarreforma que objetiva subtrair os direitos dos trabalhadores produzirá uma queda geral dos salários. Um empresário ignora ...12/07/2017 -
Senado aprova reforma de Temer e rasga legislação trabalhista
11 de julho de 2017 entra para a história como o dia em que o Senado Federal rasgou a legislação trabalhista. Abrindo mão de sua ...12/07/2017 -
CLT PODE SER MORTA NESTA TERÇA POR UM GOVERNO ILEGÍTIMO
247 - Sem qualquer legitimidade, por ter chegado ao poder por meio de um golpe parlamentar e ser alvo de denúncia de corrupção pa ...11/07/2017 -
Vigília no Senado: CTB afirma que a classe trabalhadora resistirá a todo custo
A Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) promove nesta terça-feira (11), desde às 9 horas, na entrada do anex ...11/07/2017 -
Para Renan, agenda de reformas de Temer é "ilegítima"
O senador Renan Calheiros (PMDB) não para de disparar críticas contra o governo de Michel Temer, de quem já foi grande aliado. E ...10/07/2017 -
Lula: Sabotagem dos golpistas tirou o Brasil do caminho da inclusão
A política de inclusão social dos governos Lula e Dilma tirou o Brasil do Mapa da Fome da ONU. Somente o programa Bolsa Família, ...10/07/2017 -
Compra de apoio parlamentar consome Orçamento, aponta economista
De acordo com a economista Laura Carvalho, a permanência de Michel Temer na Presidência não é só “vergonhosa”, como também está ...07/07/2017