Informativo
Sete ataques do golpe à liberdade de expressão
O
aprofundamento da crise no Brasil, a partir da dificuldade de sustentação do
governo ilegítimo de Michel Temer, somado às orientações políticas que vieram
do Planalto, impactaram seriamente o direito à comunicação e o exercício da
liberdade de expressão no país em 2017.
Por Marina Pita*
Práticas
como o uso político das concessões de radiodifusão e a privatização das
telecomunicações se intensificaram, ao mesmo tempo em que políticas públicas de
comunicação foram desmontadas e abriu-se espaço para a intervenção estatal na
gestão da Internet no Brasil.
Confira
abaixo sete episódios em que políticos – seja no Congresso ou no governo
federal – golpearam ainda mais a democracia nas comunicações do Brasil.
1. Desmonte da EBC e da
comunicação pública
Depois
da medida provisória que mudou a lei da Empresa Brasileira de Comunicação
(EBC), extinguiu seu Conselho Curador e o mandato para presidente da empresa, a
pressão governamental sobre a linha editorial dos veículos da EBC ganhou
intensidade, com ataques crescentes à sua autonomia editorial.
Em
2017, a cobertura dos veículos públicos passou a ser fortemente orientada pelo
oficialismo, ao passo que as críticas ao governo foram censuradas. Além disso,
equipes foram alteradas para retirar profissionais que não aceitavam se
submeter às imposições e novos programas foram cancelados.
Os
repasses de recursos para as emissoras que compõem a Rede Nacional de TVs
Públicas deixaram de acontecer, debilitando a diversidade na produção e
veiculação de conteúdos.
No
final de novembro, o Conselho de Administração (Consad) aprovou a retirada do
conceito de “comunicação pública” do plano estratégico da EBC, documento que
orienta objetivos e ações da empresa. Em sua versão anterior, a meta era “ser
referência em Comunicação Pública”. Agora, é “ser uma empresa referência em
comunicação”. Recentemente, as atividades da TV Brasil (pública) e da NBR
(canal estatal do governo federal) foram integradas.
2. Crescentes violações
à liberdade de expressão
No
último ano, vozes divergentes foram sistematicamente silenciadas no Brasil. A
campanha Calar Jamais!, coordenada pelo Fórum Nacional pela Democratização da
Comunicação, registrou 70 casos emblemáticos de cerceamento à liberdade de
expressão em 2017, analisados no relatório anual da campanha.
O
conjunto das violações mapeadas comprova que práticas que já ocorriam no Brasil
– como violência contra comunicadores e repressão às rádios comunitárias –,
encontraram um ambiente propício para se multiplicar após a chegada de Michel
Temer ao poder.
E
que a censura nas redes, nas escolas e nas ruas cresceu fortemente com o
aumento da repressão aos protestos contra as medidas adotadas pelo governo e o
Congresso.
O
ano de 2017 foi marcado assim por casos como o do jovem Edvaldo Alves, morto
por um tiro de bala de borracha enquanto protestava no interior de Pernambuco;
ou do estudante universitário Mateus Ferreira da Silva, que teve traumatismo
craniano após ser atingido com um golpe de cacetete na cabeça durante
manifestação em Goiânia.
O
relatório também traz o registro da invasão da Escola Florestan Fernandes, do
MST, pela polícia; da condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães; e do
flerte de Temer com a suspensão dos direitos constitucionais, por meio do
decreto presidencial de 24 de maio passado, que declarou Estado de Defesa e
autorizou a ação das Forças Armadas para garantir a “ordem” no país.
3. Intervenção
governamental no Comitê Gestor da Internet
No
início de agosto de 2017, representantes do terceiro setor, da academia e até mesmo
do mercado foram surpreendidos com a divulgação, pelo governo federal, de uma
consulta pública para mudar a composição e as atribuições do Comitê Gestor da
Internet no Brasil (CGI.br).
O
assunto não havia sido sequer mencionado dentro do Comitê, contrariando
flagrantemente seu caráter multissetorial, pelo qual é reconhecido
internacionalmente.
A
posição autocrática assumida pelo governo e conduzida pela gestão do ministro
GilbertoKassab rompeu inclusive com o compromisso assumido em âmbito internacional
pelo Brasil de garantir a participação multissetorial em todos os processos,
etapas e esferas de deliberação acerca da internet.
Após
forte mobilização social dentro e fora do Brasil (leia nota da Coalizão
Direitos na Rede), o governo foi obrigado a recuar e transferir a condução da
etapa final da consulta pública para o próprio CGI.
4. Marco regulatório da
radiodifusão ainda pior
A
dupla Temer e Kassab também conseguiu piorar o que já era ruim em termos de
democracia nas comunicações. Em março de 2017, também fruto de uma medida
provisória, foi publicada uma lei altera as regras para a exploração do serviço
de radiodifusão no país.
Medidas
como anistia aos prazos perdidos para renovação das outorgas e liberação de
aprovação prévia do Executivo para a alteração no quadro societário das
concessionárias favoreceram significativamente o empresariado.
Agora
não é nenhum exagero afirmar que os donos de rádio e televisão no Brasil estão
ainda mais livres para fazer o que bem entender com este bem que, vale lembrar,
é público.
5. Favorecimento a
políticos donos da mídia
Em
2017, o uso das outorgas de radiodifusão como moeda de troca política voltou à
baila. Em meio à crise, Michel Temer acelerou a tramitação de outorgas
apresentadas por parlamentares da base governista em busca de apoio. A denúncia
foi feita pelo jornal El País.
Com
o controle de rádios e TVs, políticos se tornam atores decisivos na cena
política e garantem sua perpetuação nos cargos. São exemplos desta prática, que
viola flagrantemente a Constituição brasileira, os atuais ministros Ricardo
Barros, Helder Barbalho e o líder do governo no Senado, Romero Jucá.
6. Empresários nas vagas
da sociedade civil no Conselho de Comunicação Social do Congresso
A
lei 8389/1991, que instituiu o Conselho de Comunicação Social (CCS), órgão
consultivo do Congresso Nacional para leis que tratam deste tema, determina que
o órgão tenha uma composição tripartite, formada por representantes de empresas
de rádio, televisão e imprensa escrita, de categorias profissionais da
comunicação e da sociedade civil.
Historicamente,
entretanto, as vagas da sociedade civil são ocupadas a bel prazer dos
congressistas.
Em 2017, tomaram posse, nas vagas de titularidade e suplência destinadas à
sociedade civil, quatro empresários das comunicações: Fábio Andrade, diretor da
America Móvel, indicado pelo próprio presidente do Senado, Eunício Oliveira;
Ranieri Bertolli, presidente da Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e
Televisão; Luiz Carlos Gryzinski, diretor da Associação Brasileira de TV por
Assinatura UHF (ABTVU); e Patrícia Blanco, representante do instituto
empresarial Palavra Aberta, indicada pelo Conar, o Conselho de
Autorregulamentação Publicitária, formado apenas por agências privadas.
Atualmente,
o CCS é o único espaço institucional de caráter nacional com assentos para a
sociedade civil.
7. Privatização do
satélite geoestacionário
Depois
de gastar mais de R$ 2 bilhões com a construção de um satélite que deveria
garantir o acesso à internet em áreas desconectadas do país, o Ministério da
Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações decidiu que privatizaria o
equipamento às vésperas de seu lançamento.
Isso
só não aconteceu porque nenhuma empresas compareceu ao leilão realizado, depois
de três adiamentos, em novembro passado. O fracasso da tentativa de
privatização mostrou, mais uma vez, que a lógica do mercado de telecomunicações
privilegia o atendimento apenas a áreas com alto poder de atração comercial,
não havendo interesse na oferta em outros territórios.
Por
isso, uma política pública que de fato universalize o acesso à internet em
todos os cantos do país depende de recursos e da gestão pública. No final do
ano, o ministro Kassab anunciou que a Telebrás vai operar o satélite, que está
no espaço desde maio.
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