Informativo
BOLSONARO ATACA SINDICATOS E DIREITO DO TRABALHO COM DECRETO QUE REGULAMENTA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA
A
minuta de decreto do governo Bolsonaro que “regulamenta disposições relativas à
legislação trabalhista e institui o Programa Permanente de Consolidação,
Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas e o Prêmio Nacional
Trabalhista” foi duramente criticada por dirigentes da CTB e pelo advogado
Magnus Farkatt durante a Reunião Ampliada do Coletivo Jurídico da CTB,
realizada na tarde de segunda-feira.
O portuário Mario Teixeira, diretor de Assuntos Jurídicos da
CTB, considerou a proposta “preocupante”, com “diversos vícios que não podemos
aceitar. Falam em respeitar as convenções da OIT, mas efetivamente estão
desrespeitando várias convenções da entidade. Mais uma vez, o governo atua no
sentido de beneficiar os empresários em detrimento dos trabalhadores”,
denunciou.
O presidente da CTB, Adilson Araújo, disse que o movimento
sindical brasileiro está diante de mais uma ofensiva do governo da extrema
direita para destruir os sindicatos. “Vamos debater a constituição de uma
Consulta Sindical Virtual sobre o Decreto em contraposição à consulta pública
proposta pelo governo”, anunciou.
O secretário-geral da CTB, Wagner Gomes, lembrou que o Conselho
Nacional do Trabalho, em que representantes das centrais sindicais têm assento,
sequer foi informado sobre a proposta, em mais um sinal do desprezo de Jair
Bolsonaro pelo movimento sindical.
DESCONSTRUIR
DIREITOS
O assessor jurídico da Central, Magnus Farkatt, fez uma análise
detalhada apontando o que considera os sete principais pontos da iniciativa
governamental e informou que os advogados das centrais estão empenhados num
diagnóstico mais profundo do decreto, que visa identificar as medidas que podem
ser tomadas posteriormente na Justiça.
Segundo
Farkatt, o governo tem o objetivo de compilar em uma única norma jurídica todos
os decretos e portarias que regulamentam a legislação trabalhista.
Supostamente, também alimenta o propósito de desburocratizar o Direito do
Trabalho, “sabe-se lá o que isto pode significar”.
Compõe-se de nada menos que 180 artigos, cabendo lembrar que as
MPs 927 e 936 continham cerca de 30 artigos cada. São 19 subtítulos abordando
temas como o descanso semanal remunerado, programa de alimentação, normas sobre
trabalho temporário, terceirização, trabalho rural e uma série de outras
matérias.
Como todo e qualquer iniciativa deste governo, a proposta contém
contrabandos e o objetivo de desconstruir direitos dos trabalhadores e
debilitar a organização sindical.
Farkatt focou sua análise em sete itens que considerou os mais
relevantes. Apontou, em primeiro lugar, o artigo 17 da minuta de decreto. Prevê
a criação de um canal eletrônico para receber denúncias e formular pedidos de
fiscalização junto à Secretaria do Trabalho, mas não faz em nenhum momento
qualquer referência aos sindicatos.
Entidades privadas podem ingressar com denúncias e pedidos de
fiscalização e quem define quais entidades privadas que têm este direito, ao
que tudo indica será o Ministério da Economia. Eles querem criar dificuldades para
que as entidades sindicais cumpram o papel de fiscalização das relações e
condições de trabalho.
Ao mesmo tempo, a pretexto de diversificação, abrem a
possibilidade de que até uma ONG seja legitimada a cumprir um papel que
constitucionalmente é assegurada aos sindicatos. É evidente a intenção de
reduzir o protagonismo do movimento sindical, o que por sinal já está em curso
desde o golpe de 2016 e a reforma trabalhista aprovada em 2017.
ENFRAQUECENDO
OS SINDICATOS
O segundo aspecto que apontou reside no artigo 18 do
anteprojeto, que contém uma série de normas de fiscalização preventiva com
objetivo de evitar acidentes e doenças ocupacional. Seria elogiável, mas não há
qualquer referência aos sindicatos. A tentativa é desconstruir o papel das
organizações sindicais em tudo que afeta os trabalhadores.
Fala-se, genericamente, de entidades representativas dos setores
envolvidos. Mas o que são? A resposta vai depender do Ministério da Economia,
cuja hostilidade ao movimento sindical e às lutas sociais é notória. A direção
do Banco do Brasil, apegada à política privatista, pode eleger a Associação dos
Funcionários em detrimento do sindicato como mais representativa dos bancários.
Sem fazer juízo de valor sobre a representatividade das
associações dos funcionários, o que teríamos num caso deste seria a retirada de
atribuições e poderes que a Constituição e a legislação trabalhista atribuem
claramente às entidades sindicais.
PRINCÍPIOS
INCOMPATÍVEIS
Já o artigo 23 cria um conjunto de princípios a serem observados
no processo de revisão das Normas Reguladoras. Cabe observar que princípios do
Direito do Trabalho, estabelecidos na Constituição, na legislação trabalhista e
na jurisprudência, não podem ser definidos por decreto.
Além disto, propõe-se o princípio de preservar a saúde do
trabalhador e ao mesmo tempo garantir os interesses da livre iniciativa e o
“pleno emprego”. Ocorre que são dois princípios distintos e nem sempre
compatíveis.
Se for considerado que uma NR criada para preservar a segurança
e a saúde do empregado atenta contra a livre iniciativa, na medida em que afeta
a possibilidade de expansão da empresa, esta norma será abolida. Teremos
dificuldades futuras para criação de novas NRs e revisão das existentes.
SEGURANÇA
E SAÚDE DO TRABALHADOR
Uma quarta questão transparece no artigo 25 e também diz
respeito à segurança e saúde no trabalho. A proposta negligencia os riscos de
porte médio e pequeno, querendo prioridade exclusiva para riscos de morte ou
incapacitação permanente. Corremos o risco de não ter qualquer espécie de
disciplina futura que regulamenta NR de riscos médios e pequenos.
O artigo 27, ao prever consulta pública para revisão das NRs,
determina que as entidades mais representativas de trabalhadores e empregadores
devem contribuir para a elaboração de novos princípios, mas não menciona
entidades sindicais. Será quem o Ministério da Economia entender como tal. Tudo
é feito com o claro objetivo de minimizar papel dos sindicatos.
Iniciativas semelhantes para debilitar o movimento trabalhista
foram observados em alguns países europeus sob orientação de governos
neoliberais, como Inglaterra e Itália, que reduziram progressivamente as
atribuições e poderes do movimento sindical enquanto destruíam e flexibilizavam
direitos.
NEGOCIADO
SOBRE O LEGISLADO
O sexto ponto apontado pelo assessor jurídico da CTB dispõe, no
artigo 35, sobre mediação coletiva e título executivo extra judicial, sempre
que houver mediação entre o sindicato e a empresa exercida pelo Ministério da
Economia.
O acordo transforma-se em título executivo extra judicial, o que
significa que não há necessidade de recorrer ao Judiciário para que prevaleça.
“Já podemos pegar o título executivo extra judicial, que tem a mesma força de
um Termo de Ajustamento de Conduta celebrado pelo Ministério Público do
Trabalho, e iniciar a execução da dívida. Ou seja, acelera o cumprimento do que
for acordado”.
Mas qual o problema?, indaga Magnus Farkatt. “Não se cria
nenhuma exceção, tudo vale”, ampliando a prevalência do negociado sobre o
legislado, o que o advogado considera “um risco muito grande”, pois não se leva
em conta a possibilidade muito real de que acordos lesivos aos trabalhadores e
à margem da legislação trabalhista podem ser assinados.
DESCANSO
AOS DOMINGOS
Finamente, o artigo 165 remete ao descanso semanal remunerado,
estabelecendo que podem ser gozados preferencialmente aos domingos, ao
contrário do que determina CLT, ou seja obrigatoriamente aos domingos, exceto
para algumas categorias especiais ou evento de força maior.
Pelo artigo 165 do anteprojeto de Bolsonaro e Guedes o descanso
aos domingos ocorrerá apenas quando o empregador considerar cabível. Não haverá
obrigatoriedade, ao contrário do que determina o artigo 67 da CLT. Estamos
diante de mais uma ilegalidade, pois o artigo 67 da CLT não foi revogado, está
em pleno rigor.
Não é a primeira vez que, contemplando interesses do
empresariado e desprezando os direitos trabalhistas, o governo busca alterar a
norma celetista e deixar ao livro arbítrio patronal a definição do dia do
descanso semanal remunerado. Tentou isto, antes, mas sem sucesso, através da MP
905/19, que acabou revogada.
O advogado alertou que a legislação municipal não se sobrepõe
aos decretos, segundo a CLT. Isto significa que se tal decreto for aprovado
normas a respeito do trabalho aos domingos favorável aos empregados
estabelecidas através de lei municipal serão atropeladas, a menos que os
patrões decidam respeitá-las por conta própria, o que é muito pouco provável.
CONSTITUIÇÃO
VIOLADA
O professor Gilson Reis, coordenador nacional da Contee, afirmou
que todo processo é realizado sem debate. “Esta situação merece uma denúncia
pública, a Constituição sendo rasgada e o decreto tem um claro viés de
deslegitimação das entidades sindicais. As centrais sindicais devem elaborar
uma plataforma comum. Não podemos ficar inertes diante desta proposta”,
proclamou.
Magnus Farkatt também identificou inconstitucionalidades no
anteprojeto, que viola claramente artigo 8º da Lei Maior, que determina que o
sindicato é o legítimo representante dos direitos e interesses dos
trabalhadores na esfera judicial e também extra-judicial. O decreto exclui os
sindicatos da formulação de denúncias.
Fonte: Portal CTB
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