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06/10/2025

RACISMO COMEÇA NO BERÇO E JÁ MARCA A VIDA DE MILHÕES DE CRIANÇAS

Pesquisa nacional revela que 63% dos cuidadores veem o racismo como realidade na primeira infância e que a discriminação já atinge bebês e crianças de até 6 anos.

Por Barbara Luz

Mesmo sendo um país de maioria negra — 55,5% da população — o Brasil continua permitindo que o racismo comece antes mesmo do nascimento e siga marcando a vida de crianças que ainda nem aprenderam a falar. Uma nova pesquisa nacional, intitulada Panorama da Primeira Infância: O que o Brasil sabe, vive e pensa sobre os primeiros seis anos de vida, revela que 63% dos cuidadores reconhecem que o racismo é comum e atinge também a primeira infância, escancarando um problema que muitos insistem em negar ou minimizar.

O levantamento, divulgado nesta segunda-feira (6) pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal em parceria com o Datafolha, mostra que 16% das crianças de até 6 anos já sofreram discriminação, principalmente em creches e pré-escolas — justamente os ambientes que deveriam garantir acolhimento e proteção.

Racismo começa antes do berço

As evidências mostram que o racismo no Brasil não espera a infância acontecer: ele começa no parto. Mulheres negras e pobres são mais expostas à violência obstétrica e recebem menos atenção nos serviços de saúde. Bebês e crianças pequenas sofrem discriminação que muitas vezes não sabem nomear, mas que deixa marcas emocionais e sociais que se arrastam por toda a vida.

O impacto é devastador: compromete a saúde física e mental, a autopercepção, as relações familiares, o acesso a direitos básicos e as oportunidades de aprendizagem. O racismo tira da criança o direito de ser apenas criança.

Creches e escolas reproduzem desigualdades

A pesquisa revelou um dado incômodo: 54% dos casos relatados de racismo ocorreram em creches e pré-escolas, ambientes que deveriam promover educação antirracista conforme determina a lei nº 10.639/2003. O que se vê, no entanto, é uma rede de ensino despreparada e muitas vezes cúmplice de práticas discriminatórias.

A percepção de que crianças pequenas são vítimas de racismo é maior entre cuidadores negros e pardos (65%) do que entre brancos (57%). Entre os mais escolarizados, o índice chega a 74%, contra 53% entre quem tem ensino fundamental. Quando o país insiste em dizer que “criança não vê cor”, está apenas legitimando o silêncio.

Racismo institucionalizado em espaços de convivência

Os relatos de discriminação também aparecem em:

- Espaços públicos como ruas e praças

- Vizinhança e condomínios

- Serviços de saúde

- Ambientes familiares

- Igrejas, templos e clubes

Proporcionalmente, crianças de 0 a 3 anos sofrem mais racismo no ambiente familiar, em serviços de saúde e espaços religiosos do que as mais velhas. Ou seja: o preconceito está entranhado nos lugares considerados de confiança.

Quando a sociedade normaliza o racismo na primeira infância, ela não só viola direitos, como compromete o futuro. As chamadas experiências adversas na infância — entre elas o preconceito — expõem crianças negras ao estresse tóxico, afetando seu desenvolvimento integral, sua identidade e autoestima.

Não é exagero dizer que o Brasil está falhando com suas crianças. Afinal, um país que deixa o racismo alcançar bebês não é apenas desigual — é negligente.

Sobre a pesquisa

Foram ouvidas 2.206 pessoas, sendo 822 responsáveis diretos por crianças de 0 a 6 anos de idade. As entrevistas aconteceram presencialmente em abril deste ano, em locais de grande circulação em todas as regiões do país. Para acessar a íntegra da pesquisa, clique aqui.

Os resultados integram o relatório Panorama da Primeira Infância, que reúne percepções, conhecimentos e práticas da população brasileira sobre os primeiros anos de vida. O levantamento também dialoga com evidências anteriores que apontam que mais de 70% das pessoas em situação de pobreza no Brasil são negras e que a maioria das mães solo de baixa renda também é negra.

Fonte: Portal Vermelho

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