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Charge de Aroeira Charge de Aroeira
16/03/2021

MISÉRIA, INFLAÇÃO E DESEMPREGO IMPULSIONAM REJEIÇÃO DE BOLSONARO

A popularidade do presidente Jair Bolsonaro está derretendo. Conforme pesquisa XP/Ipespe divulgada na sexta-feira (12), 45% dos entrevistados avaliam o governo como ruim ou péssimo – uma alta em relação aos 35% do fim do ano passado. Já a fatia dos que o consideram ótimo ou bom caiu de 38% para 30%. Para 63%, a economia está no caminho errado – e 61% veem como ruim ou péssima forma como Bolsonaro enfrentou a pandemia de Covid-19.

Especialistas apontam que a grave crise nacional – que vai além da questão sanitária – é o que impulsiona a rejeição de Bolsonaro. O desemprego elevado e a inflação alta vão continuar nos próximos meses – e essa combinação tende a pressionar ainda mais a popularidade presidencial.

O índice de miséria calculado pela consultoria MB Associados ilustra a crise. Composto pela soma da taxa de desocupação e do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) em 12 meses, esse índice se aproxima hoje de 20 pontos – o nível mais alto desde setembro de 2016. Em fevereiro, o indicador ficou em 19,8 pontos.

Para o economista-chefe da MB, Sergio Vale, o aumento do índice de miséria impacta a aprovação de Bolsonaro. Ele lembra que, em meio ao agravamento da pandemia, o auxílio emergencial deixou de ser pago. Como a expectativa é de que o índice de miséria continue a piorar nos próximos meses, “não será difícil ver” a popularidade de Bolsonaro seguir a trajetória de queda.

A inflação elevada tem afetado especialmente os mais pobres, por causa da disparada dos preços de alimentos, que pesam mais na cesta de consumo de quem tem renda mais baixa. No IPCA, a alimentação em domicílio subiu quase 20% nos 12 meses até fevereiro.

“Se considerarmos que as pressões em commodities vão continuar neste ano, será outro período de inflação de alimentos, que se junta agora a outras pressões que estão aparecendo em outros bens, com o choque cambial e a desestruturação da indústria com a pandemia”, afirma Vale. Em sua opinião, o IPCA vai atingir 7,1% no acumulado em 12 meses até maio, fechando o ano em 4,3% – acima, portanto, da meta perseguida pelo Banco Central (BC) neste ano, de 3,75%.

O cenário para o mercado de trabalho também é desfavorável para Bolsonaro. Com o fim do auxílio emergencial, a economia começou o ano patinando e tende a perder mais fôlego nos próximos meses. Devido ao forte aumento do número de casos e mortes por Covid-19, estados e municípios tiveram de adotar medidas mais rigorosas de isolamento social – o que afeta sobretudo o setor de serviços, maior empregador da economia. Nas estimativas de Sergio Vale, o desemprego – que fechou em 13,9% no ano passado na série com ajuste sazonal – ficará em 15% ou mais de abril a julho deste ano.

O índice de miséria é obviamente uma simplicação. O objetivo é dar uma ideia da sensação de bem-estar na economia, combinando a evolução do custo de vida com um indicador importante do mercado de trabalho. Vale acredita que a volta do auxílio emergencial não terá impacto significativo sobre a economia – o valor será mais baixo, o público-alvo será reduzido e o benefício, a princípio, vai ser pago por um período mais curto.

“O efeito vai ser bem menor. As pessoas vão pagar dívidas e comprar coisas básicas como alimentos”, diz o economista. Com isso, o impacto positivo do auxílio sobre a popularidade de Bolsonaro deverá ser menor do que foi em 2020.

Na projeção do economista da MB, a inflação encerrará o ano em 4,3%, “supondo que o BC reaja com rapidez” – mas o IPCA pode ficar maior. “Com o acúmulo de pressões, não será difícil nós vermos uma dupla de 5: inflação de 5% e juros de 5% – 5,5% mais precisamente”, diz Vale, referindo-se ao nível que espera para a Selic no fim do ano. Nesta semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) deverá começar um ciclo de alta dos juros básicos, hoje em 2% ao ano – ele projeta alta de 0,5 ponto percentual.

Para 2021, Vale estima um crescimento de 2,6%, “com todos os riscos políticos e de pandemia presentes”. É um número inferior à herança estatística que o ano passado deixou para este ano, de 3,6%. Se o PIB terminar o ano no mesmo nível do fim de 2020, a expansão será de 3,6% em 2021 – ou seja, pela previsão da MB, o PIB vai encerrar o quarto trimestre abaixo do patamar do mesmo período de 2020. A consultoria prevê recessão técnica no primeiro semestre, com retração da economia de 0,9% no primeiro trimestre e de 0,4% no segundo, nos dois casos em relação ao trimestre anterior.

Para 2022, Vale deve reduzir a projeção de 2,4% para menos de 2%. “A ideia é que haverá um impacto mais completo dos juros, que nós projetamos em 5,5% neste ano e em 6,5% ano que vem’”, afirma ele. “Junto com menos auxílio emergencial, isso pode tirar ritmo da construção civil. No fim, o investimento fica prejudicado pela incerteza política e o consumo, pela recuperação muito lenta do mercado de trabalho e pelo receio de perda de emprego pela população.”

Nesse quadro, o que os analistas começam a desenhar é uma recuperação mais lenta do que se esperava no segundo semestre e em 2022. O progresso da vacinação deverá ajudar, ao reduzir o contágio da Covid-19 e abrir espaço para o relaxamento das medidas de isolamento social. No entanto, os juros mais altos tendem a segurar a velocidade da retomada.

Essa avaliação de que o crescimento de 2022 será mais modesto começa a ganhar força, indicando que a economia poderá ter um ritmo de expansão modesto no ano das eleições presidenciais. Na sexta-feira, o Itaú Unibanco reduziu a estimativa para a expansão do PIB deste ano de 4% para 3,8% (o carregamento estatístico explica quase todo o número), promovendo uma redução mais significativa para a do ano que vem, de 2,5% para 1,8%.

Na visão do banco, “três fundamentos permitiam a retomada do crescimento”: o avanço da vacinação, a expansão robusta da economia global e a manutenção dos juros baixos. “O aumento do risco fiscal e a consequente deterioração das condições financeiras impedem a manutenção dos juros em patamares mais baixos e reduz a perspectiva de crescimento adiante”, diz o Itaú Unibanco, em relatório.

Um ritmo fraco de expansão do PIB em 2022, se confirmado, tira um trunfo importante de Bolsonaro na disputa pela renovação do mandato. Ainda que a inflação fique mais baixa, devido aos juros mais altos, a recuperação do mercado de trabalho não deverá ser das mais velozes.

Fonte: Portal Vermelho, com informações do Valor Econômico

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