Informativo
MOURÃO: MANIFESTANTES DEVEM SER CONDUZIDOS DEBAIXO DE VARA
Em artigo publicado no Estadão nesta
quarta-feira (03/VI), o vice-presidente, general Hamilton Mourão,
criticou os protestos contra o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem
partido) e atacou a imprensa e o ministro Celso de Mello, do
STF (Supremo Tribunal Federal), além de classificar os manifestantes como
baderneiros.
Leia a íntegra:
A apresentação das últimas manifestações contrárias
ao governo como democráticas constitui um abuso, por ferirem, literalmente,
pessoas e o patrimônio público e privado, todos protegidos pela democracia.
Imagens mostram o que delinquentes fizeram em São Paulo, Rio de Janeiro e
Curitiba. Registros da internet deixam claro quão umbilicalmente ligados estão
ao extremismo internacional.
É um abuso esquecer quem são eles, bem como
apresentá-los como contraparte dos apoiadores do governo na tentativa de
transformá-los em manifestantes legítimos. Baderneiros são caso de polícia, não
de política.
Portanto, não me dirijo a eles, sempre perdidos de
armas na mão, os que em verdade devem ser conduzidos debaixo de vara às barras
da lei. Dirijo-me aos que os usam, querendo fazê-los de arma política; aos que,
por suas posições na sociedade, detêm responsabilidades institucionais.
Aonde querem chegar? A incendiar as ruas do País,
como em 2013? A ensanguentá-las, como aconteceu em outros países? Isso pode
servir para muita coisa, jamais para defender a democracia. E o País já
aprendeu quanto custa esse erro.
A legítima defesa da democracia está fundada na
prática existencial da tolerância e do diálogo. Nesse sentido, Thomas Jefferson,
o defensor das liberdades que, como presidente eleito, rejuvenesceu a nascente
democracia norte-americana em momento de aparente perda de seu elã igualitário,
deixou-nos preciosa citação: “Toda diferença de opinião não é uma diferença de
princípios”.
Uma sociedade que se organiza politicamente em
Estado só pode tê-lo verdadeiramente a seu serviço se observar os princípios
que regem sua vida pública. Cabe perguntar se é isso que estamos fazendo no
Brasil.
É lícito usar crimes para defender a democracia?
Qual ameaça às instituições no Brasil autoriza a ruptura da ordem legal e
social? Por acaso se supõe que assim será feito algum tipo de justiça?
As cenas de violência, depredação e desrespeito que
tomaram as manchetes e telas nestes dias não podem ser entendidas como
manifestações em defesa da democracia, nem confundidas com outras legítimas,
enquanto expressões de pensamento e dissenso, essenciais para o debate que a
ela dá vida. Desde quando, vigendo normalmente, ela precisa ser defendida por
faces mascaradas, roupas negras, palavras de ordem, barras de ferro e armas
brancas?
Não é admissível que, a título de se contrapor a
exageros retóricos impensadamente lançados contra as instituições do Congresso
e do Supremo Tribunal Federal, assistamos a ações criminosas serem apoiadas por
lideranças políticas e incensadas pela imprensa. A prosseguir a insensatez,
poderá haver quem pense estar ocorrendo uma extrapolação das declarações do
presidente da República ou de seus apoiadores para justificar ataques à institucionalidade
do País.
Cabe ainda perguntar qual o sentido de trazer para
o nosso país problemas e conflitos de outros povos e culturas. A formação da
nossa sociedade, embora eivada de problemas contra os quais lutamos até hoje,
marcadamente a desigualdade social e regional, não nos legou o ódio racial nem
o gosto pela autocracia. Todo grande país tem seus problemas, proporcionais a
seu tamanho, população, diversidade e complexidade. O Brasil também os tem, não
precisa importá-los.
É forçar demais a mão associar mais um episódio de
violência e racismo nos Estados Unidos à realidade brasileira. Como também
tomar por modelo de protesto político a atuação de uma organização nascida do
extremismo que dominou a Alemanha no pós-1.ª Guerra Mundial e a fez arrastar o
mundo a outra guerra. Tal tipo de associação, praticada até por um ministro do
STF no exercício do cargo, além de irresponsável, é intelectualmente desonesta.
Finalmente, é razoável comparar o regime político
que se encerrou há mais de 35 anos com o momento que vivemos no País? Lendo as
colunas de opinião, os comentários e até despachos de egrégias autoridades,
tem-se a impressão de que sessentões e setentões nas redações e em gabinetes da
República resolveram voltar aos seus anos dourados de agitação estudantil,
marcados por passeatas de que eventualmente participaram e pelas barricadas em
que sonharam estar.
Não há legislação de exceção em vigor no País, nem
política, econômica ou social, nenhuma. As Forças Armadas, por mais malabarismo
retórico que se tente, estão desvinculadas da política partidária, cumprindo
rigorosamente seu papel constitucional. Militares da reserva, como cidadãos
comuns, trabalham até para o governo, enquanto os da ativa se restringem a suas
atividades profissionais, a serviço do Estado.
Se o País já enfrentava uma catástrofe fiscal
herdada de administrações tomadas por ideologia, ineficiência e corrupção,
agora, diante da social que se impôs com a pandemia, a necessidade de
convergência em torno de uma agenda mínima de reformas e respostas é
incomensuravelmente maior. Mas para isso é preciso refletir sobre o que está
acontecendo no Brasil.
Quando a opinião se impõe aos princípios, todos
perdem a razão. Em todos os sentidos.
Fonte:
ConversaAfiada
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